Media Training: estamos vendo erros imperdoáveis nas entrevistas
Penso que o Media Training nunca foi tão necessário no Brasil. Boa parte dos porta-vozes parecem estar com os nervos à flor da pele por conta das circunstâncias, e ignoram completamente as regras de bom senso durante uma entrevista. Obviamente este artigo não tem a pretensão de atingir nenhum governo, mas o episódio da Covid 19 mostrou cenas de completo despreparo, o que é indesculpável para profissional que ocupa um cargo de relevância e tem o compromisso de prestar contas, transmitir informações que possam orientar a sociedade. O Media Training existe para isso. É um treinamento que pode evitar crises de imagem, como as cenas protagonizadas recentemente pela Secretária Nacional de Cultura, Regina Duarte, em entrevista à CNN.
Primeiramente, uma autoridade não ter obrigação de conhecer todos códigos do jornalismo, nenhum porta-voz assume o cargo sabendo como funciona uma redação de TV, como ocorre a produção da notícia, edição e exibição de uma matéria jornalística. Mas o entrevistado jamais deve enfrentar a câmera ou receber o repórter sem estar preparado para isso. Se conhecesse um pouco dessa dinâmica, Regina Duarte jamais teria soltado ao vivo a frase que provoca arrepios em qualquer jornalista que se preze: “não combinamos isso”. Jornalista não combina o que vai perguntar pra confortar o entrevistado. Existe sim uma pauta prévia que define o tema, mas não as perguntas. O pressuposto básico de uma entrevista é a liberdade de pergunta e resposta.
A Secretária saberia também que é absolutamente normal e desejável intercalar sua entrevista ao vivo com o posicionamento de outro porta-voz que tenha outro olhar sobre o tema ou mesmo uma opinião divergente. Isso enriquece o discurso. E o que dizer do susto quando a atriz percebeu que não falaria apenas para o jornalista “combinado”? Como assim…. será que ela não assiste telejornais , não percebeu que são comuns as entrevistas compartilhadas com apresentadores em diferentes estúdios?
Nem me refiro à conduta do nosso presidente diante das entrevistas, porque notadamente fere qualquer preceito de Media Training. Ele é conhecido e, por vezes, admirado por dizer o que pensa. O que parece virtude, na verdade fere a liturgia do cargo e acaba potencializando manchetes negativas e aumentando a audiência dos veículos de informação. Os estragos poderiam ser evitados com atitudes simples como parar de responder perguntas de improviso, parar de reagir às provocações em qualquer circunstância e qualquer lugar. Improviso em momento de crise é um tiro no pé para um porta-voz, tanto pior para um presidente cuja palavra pode desestabilizar uma nação.
Os ambientes de governo são hoje celeiros de “palavras mal ditas”. A guerra política se trava nos discursos irresponsáveis, nas acusações, ameaças e mentiras. E todos só fazem aumentar a insegurança dos cidadãos. Obviamente o debate politico é indispensável à democracia, mas o que vemos não pode ser chamado de discussão de ideias. Tenho minhas dúvidas se apenas o media training daria conta dessa desordem, porque os comportamentos estão relacionados em boa parte aos desvios de caráter mas, um bom treinamento de mídia permitiria pelo menos conhecer o sistema de trabalho da imprensa e como se fala em público. Já seriam grandes sinais de respeito a quem consome notícia e de resistência à mídia que corre atrás de espetáculo a qualquer preço.